Sua partida me fez perceber o quanto eu te amo, e com o tempo, um dos meus maiores medos é acabar te esquecendo.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

"Nunca penso no futuro, ele chega rápido demais." ( Albert Einstein )

Em meio à prateleiras de vidros, armações de óculos e o eco de vários relógios com seus pêndalos realizando algum movimento chato que uma vez eu estudara em física - TIC TAC, TIC TAC, TIC TAC -, eu ainda tentava entender o motivo de ter entrato ali.
Sim, lá fora a chuva castigavam as árvores agora peladas - era outono -, mas eu já estava encharcada, e isso não servia de desculpa. Ah, tinha também o fato de que estava sem dinheiro! Então, o que eu fui fazer dentro daquela loja? Depois de alguns anos eu diria que foi o destino, o destino que fez eu decidir se fora sorte ou azar eu não ter dado meia volta quando uma cliente me encarou de baixo à cima.
Pois é, meu cabelo curto e negro estava grudado em meu rosto, meu longo vestido preto com babados de renda pingavam e sua barra estava suja de lama. É, eu devia ter dado o fora! E eu tive certeza disso quando o meu ex-marido, ou melhor, ex-noivo veio pela porta de funcionários me atender.
Bom, acho que ele não ficou tão espantado ao me ver como eu fiquei, pois ele deu aquele sorriso idiota e o meu coração parou de bater por um instante, eu juro. Ele parecia até... feliz.
- O que você deseja? - ele perguntou de trás do balcão. Não me mechi. Ele estava brincando comigo enquanto deveria, sei lá, jogar aquele enorme relógio de madeira em mim, ou talvez aquele arranjo de vidro.
Dês de quando ele estava aqui? E porquê? Seus olhos cor de âmbar me fitavam, e eu vi como ele estava bonito, e tudo isso me levou àquele dia.
- E-eu não sei - droga, odeio gaguejar.
Ele parecia estar se divertindo, eu precisava inventar algo.
- Estava fugindo da chuva.
- Você sempre gostou de andar na chuva, você falava que era ótimo para pensar. Você sabia que eu estava aqui.
Meu coração deu um pulo, ele ainda lembrava disso, minhas mãos começaram a formigar e eu tive uma leve tontura, mas aah como eu queria ter sabido que ele estava aqui, aí eu NUNCA teria entrado nessa loja. Tomando coragem eu fui até o balcão e o encarei. Ele estava alto.
- O que você quer Mike? Por que você está aqui? - fiquei feliz por a minha voz ter saído firme.
Ele pareceu relutar. Naquele momento a cliente foi até o balcão, e ele conseguiu se recompor, dando o troco à senhora, ela saiu. Agora ele me olhava com o que parecia ser compaixão, alívio talvez?
- Eu falei que tudo ia dar certo, olhe para você, você...
Ele perdeu a voz e seus olhos agora estavam marejados. Eu dei um passo para trás, pois acreditava que se ficasse ali por mais um minuto eu desmaiaria. Agora todo o meu corpo formigava e o meu coração doía, doía relembrando uma decisão que tomei à 3 anos atrás, quando fuji deixando-o me esperando no altar. Tentei lembrar como se respirava.
Então era isso? Ele veio me ver? Ou melhor... eu o encarei, a raiva fazendo meu rosto esquentar, então gritei.
- Você veio ver se eu ainda estava viva?
Ele empalideceu, e o seu silêncio foi o que bastou para eu ter minha resposta.
- Não, eu não...
- "Olhe para você" - eu gritei, imitando sua voz - Eu estou viva, satisfeito? Mas os médicos me deram apenas um ano. Abaixei a voz, minhas mãos tremiam e eu percebi que chorava descontroladamente. Eu não podia me casar com você, eu deveria ter te contado do câncer, mas é que eu não queria... eu, eu, parecia egoísmo da minha parte pegar você para mim, para depois fazê-lo sofrer.
Respirei fundo e o meu pulmão rangeu. Ele veio ao meu lado e me abraçou, e bom, aquilo era ótimo, parecia tão certo e tão errado. Mas não me importei com as minhas roupas molhadas, me concentrei em sua colônia, em seus braços em volta de mim.
- Não estou bravo com você, você teve que ser forte.
TIC TAC, TIC TAC.
- O verdadeiro motivo de eu ter vindo para cá? É, bom, deixe-me fazer parte desse seu último ano.
Eu fechei os olhos com força. Encostada em seu peito eu podia ouvir seu coração acelerado, e eu sabia qual era a resposta certa, e essa era "vá embora".
Afastei-me e relutante peguei em sua enorme mão. Seus olhos piscavam, ansiosos, e enquanto eu dizia "fique", pude sentir o meu coração se aquecendo, transbordando de alegria.
Queria dizer que naquele momento ele me beijou, mas não foi isso o que aconteceu. Ele fez parte de todos os meus últimos 315 dias de vida, e por várias semanas ficava comigo na cama do hospital conversando, de noite, de dia. Michael Balle transformou os dias que eram para serem os mais horríveis da minha vida nos melhores. Ele me amou cada segundo restante e respeitou meus sentimentos, e eu morri do lado do homem que eu amava, que foi o meu melhor amigo nesse ano.
Ter entrado naquela loja, naquele dia de outono, foi a melhor coisa que eu fiz na minha vida.


Para Amanda Souza.

terça-feira, 9 de agosto de 2011

CAIPIRAS, ESPECTROS E FLORES EXÓTICAS

Ele realmente odiava quem o tirasse de sua rotina e muito mais quando ouvia os Caipiras conversando sobre a possível origem de seu problema: quando este, sozinho no quintal, caiu na piscina e afogou-se.
Na verdade, quem fazia sua rotina era o próprio, mas é claro, as vezes Mégima chegava com sua voz aveludada e seu perfume de flores exóticas, e o persuadia a obedecê-la: jogar o lixo na rua, comer, tomar banho e as tarefas. E é claro, toda manhã sua voz era rouca e grossa, seus olhos enormes e seus braços, compridos, que o tiravam à força da cama, enquanto um "pipipipipi, pipipipipi..." repetia-se enojamente em sua cabeça, atrapalhando seus sentidos e fazendo-o ceder à Mégima.
Bruno, garoto de 11 anos, que agora preferia ser chamado de Éxpeqüi, O exterminador, mudara completamente depois do acidente. Na porta ele colou cartazes para o deixarem - com ch - em paz, escritos e pintados com cores vivas, ameaçadoras. Lá dentro ele mantinha a cama e o guarda roupa organizados, mas haviam revistas com material estranhos espalhados por todo o chão, desenhos de seres com garras e olhos vermelhos colados nas paredes. Seu telescópio não apontava para o céu e sim para o vizinho.
Mégima e Magto entravam em seu quarto quando ele estava na escola, e começaram a achar aquilo mais grave do que uma "crise de identidade". Certa manhã eles acharam uma folha com codinomes para todos da família.
Éxpqüi tinha um segredo, um grande e sério segredo, o qual ele não anotara nem em seu diário de bolso, o qual ele levava para todos os cantos. Em seu quarto ele estudava os seres de nossos planetas, aqueles que se escondiam atrás de máscaras, não estou falando dos estúpidos dos Caipiras, e sim dos ETs, fantasmas, que se fantasiavam de animais de estimação, aves em extinção, tudo isso com a ajuda de Farrytom, que dormia e vivia escondido em baixo de sua cama.
Farrytom tinha 1,50m, rua raça era conhecida por ser inteligente e sábia, e podia parecer ameaçador, mas era muito dócil. Seus pelos eram grossos e compridos, e dum tom de azul, mas na barriga estes eram marrom. Farry e Éxpeqüi eram melhores amigo e tinham um lema: "Cuidado, espectros também mordem!" De certa forma, isso fazia sentido para eles.
A forma como se conheceram é outra história, e agora, camuflados em meio a tantos Caipiras, ambos fizeram uma enorme descoberta, e da cozinha seus pais escutaram-no gritar "Farrytom" em meio à urras de alegria e risadas.
- Pensei que ele tinha perdido todos os seus bichos de pelúcia - disse a mãe, com sua voz aveludada e seu perfume de flores exóticas.
(Allana B.)

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Nolstalgia

Olhando pela janela não pude conter as lágrimas, e ao mesmo tempo que senti saudades eu me senti uma idiota.
Com o tempo as marcas das rodas dos carrinhos de rolimã começaram a sumir do asfalto negro e os dias, principalmente as noites, começaram a ficar silenciosas, sem gritos e risadas, sem canções nem o som da bola batendo no chão se escuta agora.
As coisas mudaram, não porque quisemos, mas simplesmente aconteceu. Agora não brincamos mais de esconde-esconde muito menos de polícia e ladrão. Não fechamos mais a rua para a Festa Junina e até os machucados diminuíram.
Não sei se posso por a culpa em nossa idade, agora mais avançada, ou no mundo que agora mudou. Mas estou certa de que sinto falta desses dias em que pulava corda com minhas amigas, jogava ‘béts e corria descalço até a esquina apostando corrida.
Tenho saudades de me sentar em baixo de um poste e com um pedaço de gesso ficar riscando a rua. Lembro-me de como era divertido brincar com bombinha ou colocar mamonas nos escapamentos dos carros e ficar escondida atrás de uma árvore esperando o dono dar partida.
Nunca imaginei que um dia tudo isso acabaria. Quero voltar no tempo e brincar na chuva ou pegar pombas machucadas para cuidar. Quero construir de novo uma casa na árvore ou tocar uma campainha e sair correndo.
Como era divertido brincar de “mãe da rua”, “elefante colorido”, “reloginho” e “pimball”. Amava andar de roller na rua ou brincar com minha vizinha na carriola do meu pai. Gostosas eram as noites em que caçávamos vaga lumes, explorávamos as datas vazias ou brincávamos no barro.
Era gostoso sentar na calçada e observar o movimento – que não tinha na minha rua. Nossa, como era divertido “batizar” os carros quando estes passavam: quando estávamos brincando com uma bola e um carro surgia na esquina, no momento em que ele passava nós jogávamos a bola por cima dele e começávamos a gritar.
É, estes são dias que não voltam mais e acho que foi por isso que eu me emocionei quando vi marcas de um carrinho de rolimã na Rua 11 de Março.